Haroldo Ceravolo Sereza *
A realização de um Simpósio sobre a Lei Cortez, dentro da Universidade de São Paulo, pelo Instituto de Estudos Avançados, é um marco no debate sobre as políticas do livro no Brasil. Embora o conceito da bibliodiversidade seja já objeto de vários estudos feitos nas faculdades e universidades brasileiras, inclusive dentro da usp, é a primeira vez, salvo engano, que ele é debatido por tantos especialistas do livro e da leitura, políticos e também por agentes do mercado como um tema central.
A bibliodiversidade é um termo que vem sendo pensado e trabalhado pelos editores, e especialmente pelos editores independentes, há pouco mais de duas décadas. Ele se nutre de outros conceitos ligados à ideia de diversidade, mas mantém a sua independência: as diversidades de gênero, cultura, linguísticas, de raça e política no mundo do livro são mais bem garantidas quando há bibliodiversidade, ou seja, diversidade editorial.
O uso do termo bibliodiversidade, no debate público, porém, nem sempre é preciso e/ou em consonância com a elaboração feita por esses editores. Não raro a bibliodiversidade é entendida de modo muito diminuída, como a simples existência de muitos títulos ou muitos autores, e não da forma complexa, como a presença, nos mercados do livro, de projetos editoriais diversos, em equilíbrio dinâmico e produtivo.
Creio que, nesse sentido, vale a pena registrar a definição pactuada na Cidade do Cabo, em 2014, por mais de sessenta editores, de 28 países, presentes no encontro:
Bibliodiversidade é a diversidade cultural aplicada ao mundo do livro. Ecoando com a biodiversidade, ela refere-se à necessária diversidade da produção editorial disponibilizada aos leitores. Se os grandes grupos participam, pela importância quantitativa da sua produção, de uma certa diversidade editorial, isto não garante a bibliodiversidade, que não é medida somente no número de títulos disponíveis. Os editores independentes, embora estejam preocupados com o equilíbrio econômico da sua editora, estão principalmente preocupados com o conteúdo que publicam. Suas obras podem trazer uma outra visão e uma outra voz para além do discurso mais padronizado dos grandes grupos editoriais.
Essa declaração, de cuja elaboração participei, traz também uma excelente definição do que, em português, foi traduzido por “igualdade de expressão” (fair speech em inglês):
A noção de igualdade de expressão (fair speech) completa a liberdade de expressão (free speech). Em um contexto de concentração dos media, as potências dominantes (sejam elas políticas, econômicas, religiosas, ideológicas etc.) são mais representadas e ouvidas. O fair speech defende, desse modo, o igual acesso à expressão (por exemplo, mulheres, grupos historicamente marginalizados etc.), permitindo uma real diversidade de vozes.
O uso, na mesma página introdutória do manifesto, dessas duas definições mostra bem como os editores independentes entendem a relação entre a bibliodiversidade e as outras diversidades. Para completar este breve mergulho no conceito, creio que vale, ainda, citar a definição de bibliodiversidade feita pela feminista Susan Hawtorne, editora e poeta australiana:
Bibliodiversidade é um complexo e auto sustentável sistema de contar histórias, escrever, publicar e de outras formas de produção da oratura e da literatura. Os escritores e produtores do livro são comparáveis aos habitantes de um ecossistema. Bibliodiversidade é um fator que contribui para uma vida cultural próspera e para um ecossistema social saudável.
Susan Hawtorne faz ainda uma bela analogia entre um sistema “bibliodiversificado” e a vida de uma árvore ancestral. A árvore, com suas raízes profundas, não está sozinha numa floresta: ela mantém uma relação de interdependência com uma série de organismos vivos em seu entorno. Algo semelhante deve ocorrer com a bibliodiversidade: em vez das monoculturas da mente, de poucos projetos editorias dominantes e de ambições oligopolistas, desejamos um ambiente cheio de vida e interação.
O conceito de bibliodiversidade nasceu a partir de experiências de editores militantes dentro do mercado editorial, editores que pensam o sentido econômico, político (em termos amplos, não necessariamente partidário) e cultural do que fazem. Hawthorne atribui o surgimento dele aos editores chilenos. Sua apropriação pelos editores independentes do Brasil, Índia, Austrália, México, Madagascar, África do Sul etc. faz dele um conceito nascido (ainda que haja alguma controvérsia sobre o tema) e amplificado por editores do Sul Global, organizados numa associação com sede na França, mas em articulação permanente com editores de países periféricos. O site dessa entidade, a Aliança Internacional dos Editores Independentes, traz uma bibliografia significativa sobre o conceito, mas essa produção é muito inferior à qualidade do debate travado pelos editores: ao contrário do que talvez as pessoas imaginem, esses editores registram menos do que deveriam seus debates internos. Talvez por deformação profissional, eles preferem trabalhar com textos e ideias de outros autores e campos.
Assim, o convite feito pelos organizadores deste evento, sobretudo pela professora Marisa MidoriDeaecto, é uma oportunidade para aprofundarmos e registrarmos esse riquíssimo debate sobre a bibliodiversidade.
Bibliodiversidade no Brasil
Os editores independentes brasileiros vêm discutindo o tema da bibliodiversidade também há muitos anos, quase desde o surgimento do termo. A própria fundação da Liga Brasileira de Editoras, em 2002, é resultado disso. A palavra ainda não circulava por aqui, tanto quanto corria na América Latina e na Espanha, mas os problemas que originaram esse conceito já estavam postos no Brasil na virada do século xx para o xxi: a concentração no mercado de livrarias, a exclusão dos editores independentes dos espaços privilegiados de exposição das grandes redes, a venda de “vitrines” e a adoção de práticas comerciais destrutivas pelas maiores empresas do setor. A criação da Libre, após a Primavera dos Livros, de 2001, foi uma reação a essa conjuntura de mercado que já apontava para as crises que ficariam mais claras na década de 2010.
A discussão específica do preço comum, como a Libre passou a denominar o que até recentemente se chamou muito, criando bastante ruído, de preço fixo, tornou-se rapidamente uma questão relevante dentro da entidade. Ela, no entanto, também já estava posta antes no debate sobre as políticas do livro. Ainda quando repórter, em 1999, fiz uma matéria para o jornal Folha de S.Paulosobre o preço comum, quando a Fnac entrou no Brasil, causando uma crise no mercado editorial – não nas proporções do que a gente vive hoje, mas uma crise importante. E um dos motivos dessa crise é que a Fnac, aqui, adotou desde o início uma política de preços que era proibida de praticar na França e em outros países da Europa, por conta da Lei Lang e de outras leis congêneres aprovadas em diferentes Estados daquele continente. A Fnac chegou ao Brasil aplicando o preço verde dos anos 1970, ou seja, 20% de desconto nos lançamentos, enquanto na França (de onde eu acabara de voltar, trabalhara em Paris como correspondente da Folha de S.Paulo) esse valor se limitava a 5% e, em Portugal e Espanha, onde também a Fnac atuava, este valor estava limitado a 10%.
O mundo deu muitas voltas desde então (vinte e duas, para ser preciso), e hoje, muito resumidamente, a Fnac, para competir com a Amazon, precisa desta lei – e também de outras facilidades garantidas pelo Estado francês, como a possibilidade de fusão com a rede de venda de equipamentos eletrônicos chamada Darty, para seguir operando em condições de enfrentar a Amazon.
A Libre, ao longo de várias diretorias, desde a primeira, da Camila Perlingeiro, discutiu o tema do preço comum. Citarei alguns marcos importantes desse debate, correndo o risco de deixar alguns dos participantes de fora, para que este relato não fique extenso demais. Angel Bojadsen, da Estação Liberdade, defendeu sua adoção e chamou os editores a apoiá-la em artigo intitulado “A Questão do Preço Fixo”, publicado no jornal O Estado de S. Paulo. Na gestão de Araken Gomes Ribeiro, da Editora Contraponto, em 2006, foi publicado pela entidade, do pesquisador Markus Gerlach, Proteger o Livro – Desafios Culturais, Econômicos e Políticos do Preço Fixo,e, em 2007, ano de posse da presidenta Renata Farhat Borges, Editores Independentes: Da Idade da Razão à Ofensiva?, de Gilles Colleu. Em 2009, a Libre, sob a presidência de Cristina Warth, da editora Pallas, selou um acordo com a Edinar (Editores Independientes de Argentina por la Diversidade Bibliográfica) no sentido de tentar construir indicadores de bibliodiversidade, o que infelizmente não se concretizou.
Em 2010, às vésperas das eleições gerais, também na presidência de Cristina Warth, a diretoria da Libre publicou um manifesto intitulado “Um Programa em Defesa da Bibliodiversidade”, em que o tema é citado explicitamente. O texto foi distribuído a alguns candidatos e, a partir de 2011, a diversos gestores públicos, já com o apoio da ael(Associação Estadual de Livrarias) do Rio de Janeiro, da anl (Associação Nacional de Livrarias), à época dirigida por Vítor Tavares, atual presidente da cbl (Câmara Brasileira do Livro), e da Câmara Rio-Grandense do Livro.
Este manifesto, republicado no catálogo de diferentes Primaveras do Livro, defende categoricamente a adoção do “preço único do livro e desconto justo em todos os níveis da cadeia”, o que significa, inclusive, um passo além do proposto na Lei Cortez – Lei do Preço Comum. O texto diz ainda que “a Libre defende a adoção da política de preço único e de desconto justo como garantia de sobrevivência das pequenas e médias livrarias, sem as quais se torna inviável a distribuição dos long-sellers, os livros de fundo de catálogo, os livros que não tem prazo de validade e que dão lastro a nossa cultura”.
Ainda este manifesto, num segundo item, justificava a defesa do preço comum:
Políticas agressivas de marketing, não apenas das grandes redes de livraria, mas inclusive de outros setores da economia (como bandeiras de cartão de crédito), têm atuado fortemente no setor de livros estabelecendo uma concorrência desleal entre grandes e pequenos livreiros e entre grandes e pequenos editores, o que a médio prazo destrói a cadeia do livro e, portanto, a Bibliodiversidade. Para que fique bem claro: quando os pequenos editores têm de negociar com as grandes cadeias, os descontos finais ao consumidor se traduzem em preços não viáveis para as pequenas editoras e, também, para as pequenas livrarias. Por isso o preço único, neste setor da economia, em que a concorrência se dá entre produtos que são em essência diferentes entre si, tende a favorecer a redução do preço final do livro e a concorrência, e não o contrário.
Além da defesa do preço comum, o manifesto defende outras políticas públicas inovadoras, mais condizentes com os problemas que o mercado editorial brasileiro vive hoje.
Historicamente, as políticas públicas para o livro no Brasil têm se pautado por duas frentes. Uma, a isenção de impostos, cujo marco é o texto constitucional de 1946, quando se determina a isenção do papel, até o governo Lula, momento em que ocorre a desoneração final do produto livro, com a lei 10.865/2004 – é importante registrar que as editoras não são isentas de impostos, elas os pagam em diversos momentos de sua vida econômica: Imposto de Renda, impostos e contribuições trabalhistas, impostos de serviços. A segunda política principal foi a das compras públicas. No texto, defendia-se a adoção de tarifas especiais para o livro nos Correios (hoje sob ameaça de privatização, o que ampliaria os custos do envio dos livros para editores independentes), isenção de iptu para livrarias de rua etc.
Nas presidências seguintes (dois mandatos meus, dois de Raquel Menezes e mais um de Tomaz Adour, atual presidente), a Libre manteve a questão da bibliodiversidade em pauta, organizando discussões e participando ativamente de diversos fóruns do mercado editorial e da sociedade civil. A Libre discutiu, ao longo dessas duas décadas, muito abertamente com diferentes governantes a adoção de critérios de bibliodiversidade em diferentes editais – e isso se expressa numa participação muito maior de editores independentes nessas compras do antigo Minc (Ministério da Cultura) e do mec, do qual o atual pnld literário é o melhor exemplo. Essas compras ganharam em diversidade e transparência, e ainda há muito o que avançar nos processos, sobretudo nos Estados e municípios.
Na cidade de São Paulo, representei a Libre e o mercado editorial no Grupo de Trabalho que elaborou a proposta do projeto de lei do Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas da cidade. Após uma série de quarenta reuniões plenárias, além das discussões internas do grupo, foi elaborado um projeto que menciona a bibliodiversidade como um dos princípios fundamentais (“o estímulo à bibliodiversidade em todas as suas formas”) e um de seus objetivos (“debater e promover a bibliodiversidade”), além de estabelecer uma série de metas de curto, médio e longo prazo para o livro e a leitura na cidade sustentadas por este conceito.
O livro de Gerlach, originalmente publicado na França, em 2003, discutiu muito claramente a questão da Lei do Preço Comum sob a perspectiva econômica. Já na época, este trabalho mostrava que o impacto da Lei Lang havia sido positivo não só na criação de livrarias e na construção de um mercado livreiro mais equilibrado, como também atuaria no sentido de reduzir o preço médio do livro no médio prazo. Apesar desses estudos apontarem a fragilidade dos mercados livreiros desregulados diante daqueles que adotaram a lei, as grandes redes de livrarias brasileiras, e penso sobretudo na Cultura e na Saraiva, resistiram até a morte, literalmente, à adoção do preço comum.
Nesse aspecto, a política do preço comum a ser introduzida no Brasil pela Lei Cortez é essencial para a construção de um mercado de livros bibliodiverso. Como deveria ocorrer com qualquer política pública, essa construção deve ser profundamente negociada com a sociedade e, por isso, é importante destacar a legitimidade para tratar do tema que têm as livrarias independentes, principais prejudicadas pela falta de regulação do mercado, e os editores independentes, que defendem essa bandeira há muitos anos. Muitas vezes, podemos perceber uma certa vontade de Snel (Sindicato Nacional dos Editores de Livros) e cbl de recuperarem o tempo perdido nessa discussão. É claro que só podemos comemorar a adesão plena dessas entidades à Lei Cortez. Essa boa vontade, no entanto, é tão mais bem-vinda quanto mais cuidadosa for em não apagar o protagonismo das pequenas e médias livrarias e editoras, atores do mercado com forte penetração na sociedade e, para usar um conceito caro a nosso tempo, com muito lugar de fala para tratar das vicissitudes do mundo do livro no Brasil.
Evidentemente, os leitores também são parte desse diálogo, e os estudos de acompanhamento de preços e de presença de livrarias nos países que adotaram o preço comum sugerem que eles são grandes beneficiários de uma lei do gênero: os leitores precisam saber que eles têm direitos, como a presença de uma livraria perto de casa, e que essa lei cria condições para que este, entre outros direitos, se tornem realidade.
Regulação ou autorregulação
Bernardo Gurbanov, presidente da anl, sugeriu, dentro do fórum de entidades do livro, em 2016, um Manual de Boas Práticas para o Setor Editorial e Livreiro, documento que a Libre, na presidência de Raquel Menezes, apoiou. Trata-se de um texto curto, mas muito interessante. Vou citar alguns de seus itens, que tratam dos principais temas debatidos naquele encontro. O Manual previa:
1) “incentivar a bibliodiversidade com estímulo à presença e exposição de livros de editoras independentes e acadêmicas nas livras e nos canais de divulgação do setor”; e
2) “procurar mecanismos junto com o Poder Público e a iniciativa privada que promovam o aumento do número de livrarias e pontos de venda alternativos, até atingirmos a meta recomendada pela Unesco, que é de uma livraria para cada 10 mil habitantes”. […]
5) Inibir a concorrência desleal ou predatória definida como a manipulação do preço de venda ao consumidor, operando com prejuízo ou deixando de ter lucro ou mesmo aplicando preços incompatíveis com a mínima margem para a viabilização do negócio visando aumentar sua participação no mercado.
O documento indica, com muita clareza, para onde a massa dos atores do mercado quer ir. Mas o consenso, ou algo próximo disso, não necessariamente caminha para uma autorregulamentação. Em termos de realpolitik, num cenário de hiperconcentração e, simultaneamente, com centenas de editores atuantes dependendo de poucos grandes negócios, avalio como praticamente impossível alcançarmos, como muitas vezes é proposto no setor, um acordo geral que coloque freios nos descontos sobre os lançamentos. Primeiramente, porque isso poderia, do ponto de vista legal, vir a ser (o que seria um absurdo, mas é um cenário que pode acontecer) considerado formação de cartel. Em segundo lugar, porque há grandes editoras que vivem desse jogo e, para tirá-las desse lugar, creio que apenas uma regulação externa tenha força suficiente, ao impor uma regulação universal e, ao mesmo tempo, garantir para seus gestores que o mercado caminha realmente para um sentido único. Para que tal mudança dê certo, em outras palavras, é preciso que as empresas envolvidas tenham certeza de que seus concorrentes também seguirão esse caminho, caso contrário, a “natureza do negócio” (uso aspas propositadamente) tenderá a jogar essas empresas no sistema de descontos urgentes, em busca da garantia do fluxo de caixa.
Para pensarmos a economia do livro, é central nunca esquecer que o livro é também uma mercadoria, embora não seja “uma mercadoria qualquer”. Num dezembro recente, a Nielsen, que acompanha parte significativa das livrarias, registrou a venda de cerca de sessenta mil títulos diferentes. Estamos falando de títulos, evidentemente, não de exemplares. São sessenta mil produtos diferentes. Não existe nenhum outro produto no mercado capitalista que tenha tamanha diversidade.
Esse é, do ponto de vista da economia, um dos fatores que explicam o relativo sucesso das regulações do livro. Porque o livro é um produto sem prazo de validade definido ou pré-definido. Isso faz com que a maior parte dos produtos disponíveis no mercado permaneçam “vivos” no mercado para além dos dois anos estabelecidos na Lei Lang, ou um ano previsto pela Lei Cortez. Se há, portanto, uma regra que faça com que essa massa de títulos circule melhor, ainda que eventualmente reduzindo levemente a circulação de best-sellers, a massa dos livros ficará mais barata, porque esses livros sem grande apelo de marketing passam a ter condições melhores de disputar o mercado dos leitores. Se a massa dos títulos circula mais, os livros custarão menos em juros, estoque e administração, levando a uma redução do preço médio do livro.
O ganho para o consumidor, portanto, apesar de contra intuitivo, como destacou o mediador Paulo Werneck, durante a minha particpação no Simpósio é, visto desta perspectiva, muito evidente. Como a autorregulamentação é difícil de ser alcançada, creio que o melhor caminho é a adoção de uma lei capaz de impor essa solução. Para aprová-la, precisamos ampliar o apoio da sociedade, que tem de perceber que está indo atualmente para o caminho errado sem ela: a ausência de regulação atrapalha a circulação das ideias, corrói a bibliodiversidade e faz aumentar o preço do livro.
Se quisermos um grande mercado do livro, um mercado em que se vislumbre a existência de vinte mil livrarias no país, e de centenas, talvez um milhar de editoras em condições de atender a essas livrarias, se quisermos uma presença mais forte de editoras regionais, será necessário priorizar a pequena burguesia do livro, os pequenos negócios do livro. Diante da proporção que ganharam os outros mercados, o mercado editorial é e permanecerá pequeno em relevância econômica. Mas é ele que favorece a circulação de ideias complexas, a democracia, a formação qualificada dos trabalhadores, dá espaço para os atores marginalizados – pensemos, por exemplo, no papel que a literatura periférica teve no fortalecimento do movimento negro em São Paulo e no Brasil.
Se conseguirmos direcionar nossas reflexões no mercado editorial, no debate político e legislativo e na produção de conhecimento pelas universidades para esse setor, tenho a convicção de que vamos construir políticas públicas que favoreçam o que, ao fim e ao cabo, deve ser o real compromisso de todos nós: a construção de um país de leitores.
**Fundador da Alameda Casa Editorial e Diretor da Liga Brasileira de Editores.